Da nota de 20 Pesos à cerveja nacional, a Argentina é rock.
O argentino leva o rock e seus congêneres a sério. Às vezes, leva a sério demais. O jornalista Jerônimo Burgés acha que Elvis Presley está vivo em Buenos Aires. Ele conta em um livro que o rei, depois de dedar gente graúda para os tiras, teria forjado sua morte com a ajuda do FBI e da CIA para se proteger e, no dia de seu suposto enterro, aterrissou num aeroporto argentino fechado, num avião da Pan Am, em 1977. Segundo o repórter, o guarda que cuidava da pista nunca tinha visto uma aeronave daquele porte em seu país. O autor tenta provar que Presley mora sossegado num subúrbio da capital portenha até hoje. Nem é tão difícil encontrar Elvis na Argentina. A nota de 20 Pesos leva a efígie de Juan Manuel de Rosas, governador da província de Buenos Aires que nasceu em 1793 e é a cara do rei do rock na fase Las Vegas, com costeletas, paletó com golas altas e tudo.
Mil lugares para dançar Rock
É possível que Buenos Aires seja a cidade com o maior número e fãs dos Rolling Stones por metro quadrado. Juan Gutierrez, vocalista dos Ratones Paranóicos, banda ultra-popular formada nos anos 80, vivia dizendo que a banda inglesa é como um remédio para ele, e a julgar pelo número de grupos portenhos que emulam as guitarras de Keith Richards e Ron Wood, a auto-medicação Stoniana rola solta no país. Igualmente populares são as bandas clássicas do punk rock e da New Wave, como Ramones, The Clash, Talking Heads e The Police, que estão nas camisetas de pessoas de todas as idades nas ruas da capital. Mas o rock de Buenos não vive só do passado.Nas boas famílias, ele passa de pai para filho, e estes vão ver bandas como os Satan Dealers (http://www.myspace.com/satandealers), heróis locais do rock “de pegada” e influenciado pelo MC5, Stooges e outros proto-punks. Os Dealers podem ser vistos em bares como o Salón, no bairro de Palermo, que é também onde fica o Niceto Club.
É nesse clube que acontecem duas das festas mais importantes da música local. Uma delas é a Zizek, que rola todas as quintas. Nela, Djs, músicos e produtores misturam a cumbia, ritmo originário da Colômbia que se tornou a música mais popular da Argentina, com o hip hop e a eletrônica. A pista fica sempre lotada até de manhã. No dia seguinte é a vez da Compass, a grande noite do rock e da eletrônica portenha independente.Bandas como Nikita Nipone
http://www.myspace.com/nikitamosniponemos) se alternam com Djs profissionais e convidados, os No-Djs, que podem ser jornalistas, músicos conhecidos ou alguém do público que queira fazer todos dançar ao som do indie mundial. Também no clube, a festa Phonorama faz sucesso entre os que gostam de tocar air guitar ao som de ACDC, Mano Negra, CSS, Los Fabulosos Cadillacs, Kings Of Leon, Vampire Weekend e outros. São muitas as boliches, que é como os argentinos chamam as danceterias, onde o rock é o ritmo preferencial.
Depois do curto circuito .
Isso nem sempre foi assim. Os duros anos de repressão da ditadura atrapalharam bastante o rock argentino. Músicos foram perseguidos, letras, censuradas, e até por um tempo, durante a guerra das Malvinas, toda música cantada em Inglês foi proibida nas rádios, shows e festas. Talvez por isso, mesmo com o fim do conflito e a queda do governo militar, na Argentina quase todo o rock produzido é cantado em Espanhol, embora haja exceções bem-sucedidas.
As crises econômicas também ajudaram a manter os artistas estrangeiros longe dos palcos argentinos, o que acabou sendo positivo para músicos como Charly Garcia e Fito Paez, que ocuparam o espaço vago. Mas um outro grande revés atrasou bastante a evolução da cena roqueira local: o incêndio da danceteria Cromañón.
No dia 30 de Dezembro de 2004, durante a apresentação da banda Callejeros, um incêndio tomou a boliche. A ausência de infra-estrutura e saídas de emergência de fácil acesso contribuiu para a morte de 194 pessoas. Depois dessa, grande parte de bares e clubes destinados a shows foram fechados, e quem mais sofreu foram os artistas independentes que não tinham como se apresentarem em locais maiores.
Aos poucos, a cidade foi se refazendo do trauma. O dia da música é prova disso: em 22 de Novembro, artistas de todos os tipos e ritmos tomam as ruas e parques de Buenos Aires para mostrar sua arte. Hoje, a capital argentina está definitivamente no circuito mundial dos shows de rock. Além dos medalhões Bob Dylan, Rolling Stones, Rod Stewart e The Police, toda banda
moderna que se preze inclui a cidade em seu roteiro de viagem. Interpol, Franz Ferdinand, System of a Down, Morrissey, Jarvis Cocker e uma infinidade de grupos independentes europeus, americanos e até alguns brasileiros se aventuram pela terra de Maradona. E festivais como o Quilmes Rock, a cerveja mais rock a Argentina, vieram para ficar.
Internacionalização
E completando o caldo, cada vez mais artistas argentinos começam a se projetar internacionalmente. A coletiva Zizek entrou na lista de favoritos de revistas americanas especializadas, festivais e Djs/produtores como Diplo; bandas como Los Alamos levam
seu country rock psicodélico para o Brasil, Estados Unidos e Espanha; o eletrotango do Bajofondo Tango Club e do meio-argentino Gotan Project já conquistaram o mundo há tempos; e os selos independentes portenhos e blogs especializados como o Zona Indie
- http://www.zonaindie.com.ar/- promovem uma troca de informações com todos os cantos da América Latina.
Buenos Aires é hoje um dos lugares mais vibrantes para quem gosta de rock. Ele está em todos os cantos. Basta vontade para conferir. E uma garrafa de Quilmes gelada na mão.
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